quarta-feira, 17 de setembro de 2008

Delivery da promessa : qualidade, diferenciação e criatividade

Delivery da promessa : qualidade, diferenciação e criatividade
07/2008 (Sérgio Bernardo, Aviation On Line)

O arquiteto e designer de interiores especializado em aviação fala sobre a importância de se oferecer um bom produto e um serviço de qualidade como forma de conquistar e manter fiel o passageiro.

Qualidade tem a ver com a verdade, não com o logro; com idéias, e não com técnicas; com o duradouro, e não com o efêmero; com precisão, e não com preciosismo; com sutileza, e não com alarde; com sensibilidade, e não com sentimentalismo; com competência e profissionalismo, e não com simulações; com a descoberta de analogias e contrastes; com a conjugação de elementos formais e funcionais; com proporção e harmonia; com criatividade...
É possível associar todos estes conceitos a qualquer produto com relativa facilidade, pois é próprio da natureza humana investigar tais características no universo que a obra encerra, nunca além desta fronteira. Depende, pois, de maior percepção e sensibilidade atribuir conceitos de qualidade a um serviço ou, mais ainda, à prestação de um serviço.

A qualidade de um serviço é um atributo que deve ser tangível a exemplo de um produto, sob pena de não ser percebida. Todo consumidor - de produtos ou serviços - precisa sentir o que está adquirindo. Tem a ver com a apresentação, forma, arquitetura, função e capacidade de realização contidos na expectativa do usuário. É o delivery da promessa.
Da mesma forma que o próprio mercado ensina que abrir mão da qualidade é decretar o insucesso de um produto, também na prestação de um serviço, permanecer nos limites da retórica pode causar o mesmo efeito. Por mais eloqüentes que sejam os apelos em favor da qualidade, esta precisa ser percebida pelo consumidor para que a realização se mostre eficiente. Somente com a tangibilidade da qualidade isto pode ser conseguido.

Semelhanças existem por falta de criatividade; pelo uso do óbvio, que muitas vezes parece o mais correto; por repetição de um modismo. Toda a criação parte de um repertório adquirido e isto leva à procura de elementos que ultrapassem os compromissos formais com os padrões estabelecidos: é a busca da diferenciação. Início de um processo que, agregando-se características de tangibilidade ao atributo qualidade, pode se transformar em modelo de referência. Atinge-se, então, o invejável domínio da qualidade exclusiva.

A “conquista” de Sua Excelência, o passageiro, ante a concorrência obstinada é um processo tênue que depende da eficiência e criatividade na prestação do serviço em cada elo da cadeia que vai levá-lo ao interior de um avião. Desde a promoção da venda, passando pelos pontos de contato no aeroporto, que potencializam a expectativa, até a última etapa, que se inicia já no interior do avião, onde se estabelecerá o parâmetro principal de comparação na prestação do serviço, a opção do passageiro por uma companhia aérea não pode ser considerada como definitiva. Mais do que conquistar um cliente – o que pode ser efêmero – é necessária a sua completa sedução... E isso só pode ser conseguido a bordo, pela excelência do serviço, pelo conforto e funcionalidade do equipamento e por todos os fatores que demandem competência e pontualidade. É lá, somente no interior do avião, que se realiza o “delivery” da promessa.

Ao tentarmos identificar as ferramentas mais importantes que as empresas utilizam para levar ao interior dos aviões os elementos de inovação e personalidade com os quais procuram a diferenciação, o que temos constatado é que essa busca tem sido canalizada através do conceito de “marca” (branding) e investimentos maciços em design. Dar atributos tangíveis aos elementos conceituais da estratégia de consolidação de um serviço é tarefa delicada e depende diretamente da percepção de qualidade que foi investida nos recursos que materializam o espírito contido no conceito de “branding”. É preciso, pois, que todos os elementos tangíveis que façam parte da atmosfera construída através do conceito reúnam, além da funcionalidade, conforto e coerência estética... a essência da identidade corporativa da companhia aérea.

Nessa direção temos observado gestores de importantes empresas estruturarem áreas estratégicas focadas diretamente no desenvolvimento dos principais elementos da cadeia onde o cliente tem os seus “momentos da verdade”. Na menina dos olhos está a cabine de passageiros dos aviões e todos os conceitos de serviços e produtos que transformam “qualidade” em recurso tangível. Gerenciar o elenco de influências que definem “produto” e agregam valor ao serviço requer equipe de especialistas afinados com a filosofia corporativa. Uma boa estrutura para o desenvolvimento de produtos deveria abranger as seguintes áreas:

  1. Marketing (branding), que traduz o espírito, a estratégia de posicionamento, a filosofia corporativa e os requisitos do mercado em produtos “conceituais”. Define o conceito e a política de implementação do serviço.

  2. Serviço de Bordo, que se encarrega de materializar o conceito através do desenvolvimento dos produtos de natureza dinâmica (sotware), em função do consumo e renovação, e da entrega desses produtos ao cliente.

  3. Entretenimento, pela dimensão que os novos sistemas alcançaram no conceito de “produto de alto valor agregado” oferecido ao cliente. Atualmente é um dos mais importantes elementos de diferenciação.

  4. Design de Interiores, que transforma o conceito em produto tangível através do equipamento fixo (hardware) a bordo dos aviões - poltronas, lavatórios, monumentos - além do próprio ambiente arquitetônico que é o interior de um avião, traduzida pela seleção dos materiais de acabamento, decoração e iluminação da cabine.
Mais do que o projeto de novos produtos e o planejamento da sua implantação, é após a efetivação do serviço ou instalação dos novos equipamentos que a equipe de gerenciamento deverá concentrar os seus esforços. Uma empresa aérea que sustenta o apelo de venda através da credibilidade da sua marca não pode prescindir de zelar, diretamente, pelos elementos que traduzem a tangibilidade da qualidade do seu serviço. É preciso capacitar e motivar os comissários de bordo, para que sejam os principais aliados no delivery da promessa. É preciso controlar os fornecedores externos para que os produtos consumidos em vôo estejam dentro dos padrões desenhados pela equipe de projeto. É preciso adequar as rotinas de manutenção para que os responsáveis pela funcionalidade do equipamento, terceirizados ou não, sigam processos especificados de acordo com padrões aprovados e, finalmente, é preciso nivelar os critérios de importância entre todos os sistemas de um avião, para que os investimentos em manutenção não sejam priorizados tão somente em função dos requisitos de aeronavegabilidade.

Ante a percepção do passageiro, o vôo seguro é condição básica da prestação do serviço pelo qual ele paga. Entretanto, a falha numa poltrona, um lavatório inoperante, uma projeção de vídeo deficiente, uma comida fria, uma bebida quente e, até mesmo, a falta de um sorriso representam expectativas frustradas que podem levá-lo diretamente aos braços do concorrente na próxima viagem. A perfeita integração das diversas áreas de gerenciamento e desenvolvimento de produtos representa a verdadeira vantagem competitiva na oferta de um serviço consistente.

Sérgio Bernardo é arquiteto e designer de interiores. Trabalhou em engenharia de aeronaves (interiores) na VARIG e na VEM e hoje é consultor independente. É de autoria de Sérgio Bernardo a logomarca de Aviation On Line. Contatos pelos telefones (21) 2622-3795 e 9642-5921 ou pelo e-mail sergio.bernardo@uol.com.br.