SÃO PAULO – Enquanto muitas empresas colocavam novos projetos em suspensão ou diminuíam o ritmo de atividades por causa da crise internacional, a Azul Linhas Aéreas, a mais nova companhia aérea do Brasil, começou a voar em 15 de dezembro de 2008, antes até do que estava programado. No início ela registrou uma média de 45% de ocupação em seus vôos operados a partir do Aeroporto de Viracopos, em Campinas, São Paulo, com um aumento para 70% em fevereiro e 120 mil passageiros transportados em dois meses.
“Isso mostra uma excelente aceitação, o reconhecimento do público de um bom produto. E mostra também, diferentemente do que dizem os ‘donos do mercado’, que existe espaço para uma terceira companhia que tenha um produto diferenciado”, disse nesta quinta-feira (12) à ANBA o presidente da empresa, Pedro Janot. Hoje a aviação doméstica no Brasil é praticamente dominada por duas companhias: Tam e Gol.
A confiança no negócio é tanta, que a diretoria acredita que a Azul vai começar a dar lucro aos seus investidores já a partir do segundo semestre deste ano. O investimento inicial foi de US$ 200 milhões. “A série de dados históricos dos últimos 10 anos mostra que o mercado brasileiro de aviação cresce numa proporção de 4 para 1 em relação ao PIB. Então nós sabemos que, independentemente da crise, deve crescer pelo menos 10%, isso se a crise for muito dura”, declarou o executivo.
De acordo com ele, o negócio foi pensado para “além da crise”, tendo como horizonte a expectativa de crescimento do mercado no longo prazo. “É um mercado que dobra com facilidade se tiver serviços [disponíveis]”, disse.
Além disso, diz Janot, se a turbulência internacional tornou o cenário econômico incerto, fez com que a cotação do petróleo caísse de quase US$ 150 o barril para menos de US$ 40 em menos de seis meses, e o combustível é um dos principais fatores de custo de uma companhia aérea.
Para o executivo, embora a crise seja “agressiva” o Brasil é um país de dimensões continentais que precisa de mais conexões aéreas. Ele acrescentou que a aviação não acompanhou o desenvolvimento econômico ocorrido no país nos últimos anos, havendo demanda reprimida.
Nesse sentido, um dos diferenciais da Azul em relação às outras empresas, segundo ele, é a proposta de oferecer vôos diretos entre diferentes destinos, mesmo separados por longas distâncias. Hoje a aviação comercial brasileira usa basicamente três grandes centros de trânsito: Brasília, São Paulo e Rio de Janeiro. Geralmente para ir de uma região a outra do país é preciso fazer escala em um desses “hubs”, e às vezes mais de uma.
Base
Inicialmente a Azul pretendia ter sua base no Aeroporto Santos Dumont, no Rio, mas expectativa de que o terminal fosse aberto para vôos além da ponte aérea Rio-São Paulo ainda não se confirmou, e a empresa teve que basear suas operações em Campinas, no interior paulista, uma região bastante populosa e de alto poder aquisitivo, mas pouco explorada pelas companhias aéreas.
Segundo Janot, quando a Azul começou a voar havia apenas 19 vôos de passageiros por dia em Viracopos. Só para se ter uma idéia, enquanto pouco mais de 1 milhão de passageiros passaram pelo Aeroporto de Campinas em 2008, o movimento no Aeroporto Internacional de Guarulhos, o mais movimentado do país, também em São Paulo, foi de 20,4 milhões de pessoas, de acordo com dados da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero).
Na avaliação de Janot, até hoje as empresas aéreas pensaram apenas em sua própria conveniência, obrigando os passageiros dessa região a se deslocar para Guarulhos ou Congonhas, em São Paulo, para pegar um avião. A Azul está fazendo o caminho inverso, oferecendo serviços de transporte rodoviário para passageiros da capital paulista que queiram pegar seus vôos em Campinas, afinal as duas cidades ficam distantes apenas 96 quilômetros, menos de uma hora de viagem.
Hoje, de acordo com executivo, entre 30% e 40% dos passageiros da Azul vêm da região metropolitana de São Paulo. Mas, mesmo que a empresa não tivesse esse público como um de seus alvos principais, o potencial de Campinas justificaria o uso mais intenso de Viracopos. O que ocorre, segundo ele, é que os moradores da região ainda “não têm o hábito” de tomar avião em sua própria cidade, algo que vai demorar algum tempo e exigir certo investimento em marketing para mudar.
Avião nacional
Outros diferenciais oferecidos pela companhia, de acordo com Janot, são os assentos maiores revestidos em couro; a existência de fileiras somente com dois assentos – uma enquete feita pela Jet Blue nos Estados Unidos mostrou que a poltrona central é uma das coisas mais odiadas pelos passageiros -; os serviços de terra e de bordo; e os aviões utilizados. A Azul é a primeira empresa a utilizar os jatos da família Embraer 170/190 no Brasil. Apesar de serem fabricados no país e fazerem muito sucesso no exterior, essas aeronaves ainda não voavam comercialmente por aqui.
“O avião nacional. Isso tem tido uma repercussão muito grande junto aos nossos clientes, que ficam surpresos com o avião”, disse Janot. A empresa hoje opera com sete aeronaves dos modelos Embraer 190 e 195 que podem levar entre 106 e 118 passageiros. Os jatos foram inicialmente projetados para a aviação regional, pois carregam menos gente do que os Airbus e Boeings, como os utilizados pela Tam e Gol, em tese mais indicados para voar em rotas de alta procura. O executivo diz, porém, que os aviões da Embraer têm um custo de operação 35% menor e a estratégia da companhia, de criar vôos ponto a ponto entre cidades hoje não atendidas por rota diretas, vai “ativar a demanda”.
A Azul tem mais 36 aviões encomendados da Embraer e outras 40 opções de compra que, no futuro, podem ser convertidas em pedidos firmes. Embora a empresa seja nova, seu fundador, o norte-americano David Neeleman, tem longa experiência com essas aeronaves. Ele é também o criador da norte-americana Jet Blue, que há anos é grande cliente da indústria brasileira.
A legislação brasileira impede que estrangeiros tenham mais de 30% de uma empresa aérea, mas Neeleman não teve problemas com isso, pois nasceu no Brasil e viveu aqui com a família até os sete anos de idade, tendo cidadania brasileira. O empresário ocupa o cargo de presidente do Conselho de Administração e é um dos acionistas da empresa, ao lado da Gávea Investimentos, do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga, da Cia. Bozano, do bilionário gaúcho Júlio Bozano, e de outros investidores.
Hoje, além de Campinas, a Azul voa para Curitiba, Vitória, Porto Alegre e Salvador, começa no dia 18 a atender o Recife e, em março, Fortaleza, Manaus, Navegantes (Santa Catarina) e Rio de Janeiro. A idéia original era atender 28 cidades até 2011, mas, segundo Janot, o número pode variar de acordo com as condições do mercado. Atualmente a prioridade é desenvolver a malha nacional, mas nada impede a empresa de operar vôos internacionais no futuro. As aeronaves têm autonomia para chegar em praticamente qualquer ponto da América do Sul.
A Azul emprega 830 pessoas e trabalha “dentro de uma filosofia de baixo custo e baixa tarifa, mas com agregação de valor”. Quanto maior a antecedência da compra, mais baratas são as passagens. “É uma companhia sequinha”, concluiu o executivo.
Fonte: DCI